PROBLEMA: Servidor demitido, afastado ou exonerado quer retornar ao cargo público.

27/07/2019

SOLUÇÃO: Se imotivada, tendo de passar por processo administrativo garantido a defesa, a demissão/exoneração pode ser anulada com a reintegração do servidor.

Diante da complexidade da relação jurídica existente entre a Administração Pública e seus servidores, foram criadas diversas formas de provimento ao cargo público. Provimento como o próprio termo já denota, é o ato administrativo de investidura no cargo público efetivo ou em comissão. A Constituição Federal e a Lei 8.112/90 trouxeram a reintegração do servidor como uma das formas provimento ao cargo público. Por conseguinte, cabe analisar os principais aspectos que envolvem a reintegração do servidor, que se destaca como uma das mais apreciadas pelo Poder Judiciário.

Dentre as formas de provimento em cargo público, temos o reingresso, ou seja, o retorno do servidor ao serviço público pela ocorrência de determinado fato jurídico previsto no estado funcional e significa a investidura do servidor depois de extinta a relação estatutária, configurando assim modalidade de provimento derivado.

A reintegração como uma das formas de provimento do agente público, consiste no reingresso do servidor ao cargo mediante decisão judicial ou administrativa que anule sua demissão por considerá-la ato ilegal. O servidor antes desligado do serviço retorna ao cargo de origem ou ao cargo sucessor, isto é, que dele resultou por via da transformação. A reintegração no serviço público está prevista no texto constitucional em seu art. 41, § 2º.

Por mais simples que tal conceito pareça, na prática, uma grande dúvida paira os servidores reintegrados: quais são as vantagens devidas aos servidores públicos reintegrados? Em relação aos servidores públicos federais, os já mencionados artigos 41, §2º da CF e 28 da Lei 8.112/90 trazem as vantagens devidas ao servidor reintegrado: remuneração proporcional ao tempo de serviço e ressarcimento de todas as vantagens pessoais ou inerentes ao cargo devidas durante o afastamento. Os Estados e Municípios podem definir regras específicas para seus servidores, desde que não contradigam os comandos gerais da CF. Partindo de tais comandos legais, chegamos à conclusão de que o servidor reintegrado terá direito a todas as vantagens, pessoais e as legalmente inseridas e típicas do cargo, bem como aos vencimentos não percebidos durante o afastamento ilegal, como se nunca tivesse sido afastado, uma vez que a decisão anulatória do ato ilegal que ocasionou a extinção da relação estatutária possui efeitos ex tunc, ou seja, retroagem até a origem da ilegalidade.

Numa primeira leitura do texto pode-se concluir equivocadamente que apenas através de uma decisão judicial o servidor pode ser reintegrado ao cargo, bem como que a reintegração é uma forma de recondução apenas para o servidor estável. Não obstante, é imperioso ir além da interpretação literal da norma, uma vez que como todos sabem a própria Administração pode anular seus atos quando eivados de ilegalidade. Portanto, em uma análise mais acurada embora a Constituição fale em sentença judicial, não foi objetivo de o constituinte restringir o retorno do servidor demitido ilegalmente a uma decisão judicial, podendo a própria Administração rever seus atos e decidir pelo retorno do servidor. Por outro vértice, a Constituição também delimita que o servidor estável demitido ilegalmente será reintegrado. Nesse contexto, de imediato surge o seguinte questionamento: e os servidores não estáveis podem ser reintegrados? Os servidores públicos atingem a condição de estabilidade após três anos de efetivo exercício, segundo o disposto no art. 41, caput da Constituição Federal. O período que antecede à estabilidade é um período de prova do servidor conhecido por estágio probatório. A maioria da doutrina administrativista ao conceituar a reintegração seguindo o texto constitucional especifica que se trata de se reconduzir o servidor estável ao cargo. Daí porque muitos doutrinadores não utilizam o termo reintegração para o servidor não estável que retorna ao cargo após anulação da demissão. Ao tratar do tema a Lei 8.112/90 atribuiu a possibilidade de reintegração ao servidor estável não preconizando sobre o servidor sem estabilidade.

A Cobra Tecnologia S.A. deve reintegrar ao emprego um técnico de operações despedido por, supostamente, não ter a formação exigida no edital do concurso realizado pela empresa. O trabalhador é técnico em telecomunicações e o edital exigia a formação de técnico em eletrônica, mas pareceres do Ministério da Educação (MEC) e do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea) atestaram a compatibilidade entre as duas formações. A condenação foi imposta pela 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que reformou sentença do juiz Adriano Santos Wilhelms, da 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo. A reclamada também deverá pagar os salários do período em que o reclamante ficou afastado. Ele foi dispensado em julho de 2010.

Essa é inclusive a tendência atualmente adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, o qual entende que o servidor público reintegrado terá direito a indenização integral dos vencimentos não percebidos durante o afastamento, período compreendido entre o ato de exoneração e a reintegração, bem como o direito de cômputo do período de afastamento como tempo de serviço.

Demonstrando tal entendimento consolidado, destaca-se o trecho do voto do Exmo. Min. Herman Benjamin no Agravo Regimental em Recurso Especial nº 1372643 RJ: "A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o servidor público reintegrado ao cargo, em virtude da declaração judicial de nulidade do ato de demissão, tem direito aos vencimentos e às vantagens que lhe seriam pagos durante o período de afastamento."

A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba, por unanimidade, manteve a sentença da juíza da 1ª Vara Mista da Comarca de Ingá, Isabelle Braga Guimarães de Melo, que condenou o Município a pagar os salários do período de 11 de janeiro de 2013 até a data da efetiva reintegração do servidor concursado Petrônio de Vasconcelos Lima, que foi exonerado sem o devido processo legal. O relator da matéria foi o desembargador Leandro dos Santos. De acordo com os autos (Apelação Cível e Remessa Necessária nº 0000872-49.2013.815.0201), o promovente foi admitido em dezembro de 2012 pela Prefeitura Municipal de Ingá após aprovação em concurso público. No entanto, mesmo em pleno exercício de suas funções, foi surpreendido pelo Decreto Municipal nº 04/2013 (janeiro de 2013), suspendendo todos os atos de nomeação de servidor aprovado no último concurso para provimento de cargos da Administração Pública. Diante desse fato, Petrônio ingressou com ação judicial, pugnando pela reintegração ao cargo público. Sua pretensão foi julgada procedente. O Município apelou, aduzindo que o recebimento de vencimentos está condicionado ao efetivo exercício do cargo público. Ao analisar o caso, o desembargador-relator citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no sentido de que a reintegração de Servidor Público, que decorre da ilegalidade de demissão, implica na sua anulação e no consequente pagamento dos reflexos financeiros correlatos. "Neste contexto, declarada a nulidade do ato administrativo do qual decorreu a exclusão do promovente dos quadros da Prefeitura Municipal de Ingá, este ato opera efeitos retroativos (ex tunc) para alcançar o momento da edição do referido ato", ressaltou Leandro dos Santos, acrescentando que o pagamento das parcelas pleiteadas pelo autor é mero resultado do restabelecimento da situação de legalidade, servindo-lhe como indenização pelo tempo em que foi impedido de exercer suas funções, tudo a ser corrigido monetariamente e acrescido dos juros de mora.

A invalidação do ato administrativo que rompeu o vínculo do servidor público com a administração pública enseja o recebimento de toda a remuneração que a situação jurídica original lhe proporcionava e que deveria ser recebida durante o período do afastamento, haja vista que o ato administrativo ilegal acarreta inúmeros prejuízos ao servidor. Dentre as vantagens de natureza remuneratórias devidas ao servidor reintegrado temos o pagamento da remuneração referente ao tempo em que ficou afastado, o pagamento a título de 13º salário o adicional de férias, bem como as vantagens inerentes ao cargo previstas em Lei. Por fim, outra dúvida consequente a reintegração de servidor público, diz respeito ao recebimento das vantagens chamadas propter laborem. Segundo os Tribunais pátrios, tais verbas possuem natureza indenizatória, e seriam devidas tão somente ao servidor que efetivamente presta a atividade, uma vez que tem caráter precário e eventual que não atinge a todos aqueles que exerçam um mesmo cargo. Diferentemente não pensam os diversos Tribunais pátrios, sendo importante destacar alguns julgados, tais quais a Apelação Cível nº 24090207424 do TJ-ES, Relator Des. Fed. Namyr Carlos de Souza Filho; AC 200751010144280 - Desembargador Federal Guilherme Couto - TRF 2ª Região; AgRg no RMS 16.414/GO, Rel. Min. GILSON DIPP. Dessa forma, verbas como adicional de periculosidade e insalubridade, horas extras, auxílio alimentação, auxílio transporte e demais gratificações que não incorporam o vencimento-base do servidor público, de acordo com a jurisprudência não são devidas quando de sua reintegração.

O sistema jurídico administrativo respeitando aos princípios constitucionais possibilita mesmo após o processo administrativo que o ex-servidor recorra ao judiciário para afastar a ilegalidade. Constata-se que o servidor afastado ilegalmente tem asseguradas todas as vantagens como se jamais tivesse sido vítima do ato administrativo ilegal perpetrado pela Administração Pública.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: O texto constitucional determina que a reintegração somente se aplica ao servidor estável. O que se pode concluir daí não é o absurdo de que o servidor não estável, demitido irregularmente, que tenha a demissão invalidada pela Administração ou pelo Judiciário, simplesmente não retorne ao cargo. Também é absurdo entender-se que o servidor não estável não pode ser demitido, somente exonerado, pois demissão é punição por falta grave e exoneração é desligamento, ou sem qualquer caráter punitivo, ou por insuficiência de desempenho (CF, art. 41, §1º, III), ou por inabilitação no estágio probatório. O servidor afastado ilegalmente pode diante das peculiaridades do caso fazer uso do mandado de segurança ou ainda de ação ordinária. Em regra, utiliza-se o mandado de segurança que é a ação cabível para assegurar o direito líquido e certo, mormente diante do grave dano ou risco irreparável que o afastamento do cargo pode propiciar ao servidor. O servidor tem na advocacia o caminho correto para promover a medida judicial cabível.

João Neto

Advogado

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FONTES:

jornaldosudoeste.com

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