PROBLEMA: Consumidor esta pagando juros de obra, mesmo após o prazo de entrega das chaves.

26/10/2019

SOLUÇÃO: É ilícita a cobrança de juros de obra, ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves, incluído o período de tolerância.

A taxa de evolução de obra, também conhecida como 'juros de obra', é cobrada nos financiamentos na modalidade crédito associativos para aquisição de imóveis na planta, em que o agente financeiro também é o responsável pelo financiamento da obra.

Portanto a cobrança dessa taxa torna-se ilegal quando o consumidor continua a pagá-la após o prazo estipulado no contrato para a entrega das chaves. Isso quer dizer que, caso a construtora não cumpra o prazo de entrega do empreendimento estabelecido no contrato, ela não pode mais cobrar a taxa dos compradores. A ilegalidade da cobrança também é verificada quando o consumidor não é informado sobre a mesma no momento da compra. De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, antes de fechar qualquer negócio, o consumidor precisa ter todas as informações sobre o produto, inclusive eventuais cobranças adicionais.

Diversas são as ações que têm surgido em face de construtoras, incorporadoras e instituições financeiras que operam o programa do Governo Federal "Minha Casa Minha Vida" (neste texto, levamos em consideração a maior delas, qual seja, a Caixa Econômica Federal), discutindo os comumente chamados "juros de obra" ou "taxa de evolução de obra". Nessas ações, de modo geral, os mutuários (beneficiário do programa social) pretendem a restituição em dobro de valores pagos a casa bancária no período de obras, ou seja, período anterior a entrega das chaves do imóvel. Neste ponto, necessários esclarecimentos acerca de um dos modelos de negócio utilizados na realização e comercialização das unidades habitacionais capitaneadas pelo programa do Governo Federal "Minha Casa Minha Vida", especialmente nas operações que tem como agente financeiro a Caixa Econômica Federal. Nesse modelo de negócio de que trata o presente artigo, a Caixa Econômica Federal se responsabiliza, desde o início das obras, pelo aporte do capital necessário para desenvolvimento das mesmas. Não há obtenção de crédito imobiliário pelas incorporadoras/construtoras do empreendimento residencial popular, de modo que as construtoras que realizam as obras recebem um valor fechado final, de acordo com as medições mensais de obras efetivamente realizadas no período.

Durante esse período anterior a entrega das chaves, o mutuário paga a Caixa Econômica Federal somente os encargos contratuais, não havendo pagamento ou batimento do valor do principal.

Ainda segundo as normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, a cobrança da taxa de evolução deve estar detalhada no contrato de compra e venda do imóvel. Ocorre que esse encargo é repassado aos compradores, direta ou indiretamente e há casos que esse repasse é formalmente pactuado, porém existem casos que esse repasse ocorre de forma dissimulada. Em relação aos juros que incidem sobre a taxa de evolução, eles devem seguir a correção do Índice Nacional de Custo da Construção (INCC).A correção de juros sobre o valor desta taxa também é considerada abusiva, mas é possível exigir judicialmente a devolução do dinheiro em dobro, com juros e correção. Em caso de atraso na entrega da chave, a cobrança da taxa deve ser suspensa imediatamente. Essa é a principal causa que leva os consumidores a entrarem na Justiça contra a cobrança. O pagamento de juros de obra, além da data prevista para entrega das chaves, deve ser suportado pela construtora. Caso isto não aconteça, o consumidor/mutuário poderá ingressar com ação para receber pelo período extrapolado, pois fere o artigo 6º, VI e VII, do CDC (Código de Defesa do Consumidor), além dos artigos 186 c/c 927, parágrafo único, do Código Civil. O crédito associativo (juros de obra) não é bom para o consumidor/mutuário adquirir um imóvel, pois enquanto a construtora não termina a obra e averba o Habite-se, o consumidor continua pagando a taxa de evolução de obra, sem ter a possibilidade de amortizar seu saldo devedor junto ao agente financeiro.

A 6ª Turma do TRF1 deu parcial provimento à apelação interposta por um mutuário contra a sentença, proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária de Feira de Santana/BA, que julgou improcedente o pedido do autor de declaração de ilegalidade de cobrança de juros compensatórios, após a entrega das chaves, de devolução em dobro de valores descontados e a compensação com eventual débito a ser apurado, formulado contra a Caixa Econômica Federal (CEF) em razão de contrato de mútuo habitacional (financiamento de imóvel) firmado entre as partes.O requerente alegou que a cobrança indevida de juros compensatórios após o prazo para a conclusão da obra foi realizada pela CEF, devendo ser tais valores ressarcidos pela instituição financeira; o contrato firmado entre o recorrente e a CEF dispõe expressamente que a cessação de cobrança de juros de obra e o início da amortização se dão após a fase de construção, sem mencionar qualquer necessidade de apresentação documental; que o contrato firmado explicita que se iniciará a amortização findo o prazo para o término da construção mesmo que não concluída a obra, ficando bloqueados os repasses de valores à incorporadora a significar, portanto, que havendo atraso na construção do imóvel, o prejuízo será apenas da incorporadora; não há previsão contratual de que o prazo da amortização se inicia com a finalização do empreendimento, sendo por isso ilegal a cobrança efetivada pela CEF e que se aplica ao caso o Código de Defesa do Consumidor (CDC), com a inversão do ônus da prova em favor do consumidor. O relator da apelação, desembargador federal Jirair Aram Meguerian, afirmou que o contrato de financiamento habitacional firmado pelo autor prevê encargos distintos: uns devidos durante a fase de construção e outros que incidem depois dessa fase, denominados prestações de retorno. Assinala que, nos termos previstos no contrato, não pode haver cobrança de encargos de construção após o término do prazo desta. Observou o magistrado que a sentença deve ser reformada, já que mesmo na ocorrência de atraso na conclusão da obra não havia autorização para prorrogação de cobrança de encargos de construção. Vale dizer que uma vez concluído o prazo para término da construção deve ter início o período de retorno. Assim, ainda que prosperasse a tese levantada pela CEF e acolhida pelo Juízo de primeiro grau acerca de que o prazo de construção deveria ser entendido como prazo para conclusão do empreendimento, não se pode olvidar que este estaria sujeito à previsão constante do cronograma de entrega estipulado pela própria CEF, conforme expressamente previsto no contrato. O desembargador frisou que, de acordo com tal documento, o prazo para encerramento da fase de construção da obra, mencionado expressamente no contrato, deu-se em 30/08/2011, podendo os encargos de construção serem cobrados apenas até aquela data, conforme previsão contratual; assim sendo, a partir de 20/09/2011 só caberia à CEF a cobrança dos encargos de retorno pertinentes à fase de amortização contratual, independentemente de eventual conclusão da obra ou do empreendimento, lembrando que quanto a este último marco não há qualquer previsão contratual. Anotou o relator que a legalidade da cobrança da chamada taxa de construção, ou juros de obra, ou, ainda, juros de pé, antes da entrega das chaves de imóvel adquirido na planta, já está pacificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).Dessa forma, é indevida a cobrança dos juros de construção durante o período que sucedeu o prazo estipulado para a entrega do imóvel, devendo ser restituído ao autor o que foi pago após 30/08/2011, data prevista para o fim da fase de construção da obra, ainda que as chaves tenham sido entregue. Concluindo, o magistrado destacou ser incabível a restituição em dobro dos valores indevidamente pagos pelo autor, em face de decisão do STJ ao apreciar recurso em que se discutia questão vinculada a contrato de mútuo, firmado segundo as regras previstas para o SFH, "a repetição em dobro do indébito prevista no art. 42, parágrafo único do CDC exige a existência de pagamento indevido e de má-fé do credor".

Essas questões - encargos devidos e não abatimento do principal no período de obras - devem estar claras no contrato de financiamento com pacto de alienação fiduciária, até para que, de acordo com as previsões protecionistas dos consumidores, não seja alegada nenhuma nulidade ou ausência de informação que possa gerar direito a indenização aos mutuários. Após a fase de construção, então, passam os mutuários a realizar o pagamento à Caixa Econômica Federal das parcelas mensais, devidamente ajustadas nos termos do contrato, pelo período que tiverem negociado no momento da assinatura do mesmo. Ou seja, inicia-se, após a entrega das chaves, o período de pagamento do principal, assim considerado o valor que efetivamente é objeto do contrato de mútuo bancário. Este modelo de negócio vem sendo largamente utilizado em todo o território nacional, sem representar nenhuma abusividade ou ilegalidade em detrimento dos consumidores, posto que, pelo seu caráter social, não são cobradas taxas extras ao contrato (como se alega em muitas dessas ações judiciais), mas unicamente a remuneração do crédito disponibilizado pelo agente financeiro ao beneficiário do programa. Os encargos previstos no contrato para o período de construção representam pura e simples remuneração de capital, visto que, como a obra já vem sendo paga pelo agente financeiro mesmo antes do período de amortização do principal, é perfeitamente plausível que à época em que isso passe a acontecer - após a entrega dos imóveis - o capital inicialmente disponibilizado pela Caixa Econômica Federal, por exemplo, coincida com o real valor pago pelos adquirentes. Esses contratos, ao preverem essa separação dos momentos de obra e forma de cobrança, cumprem fielmente o dever de informação ao consumidor, tendo em vista esclarecer de maneira suficientemente objetiva a incidência e forma de cobrança de remuneração do capital, calculado sobre o saldo devedor, especialmente durante o período de obras.

A taxa de evolução de obra é uma tarifa paga pelo adquirente durante o período de construção do imóvel. No entanto, torna-se ilegal quando o consumidor continua a pagá-la após o prazo no contrato para a entrega das chaves. Além disso, a correção de juros sobre seu valor é considerada abusiva. Segundo a AMSPA (Associação dos Mutuários de São Paulo e Adjacências), quando alguma dessas alternativas ocorre, o proprietário prejudicado pode exigir judicialmente a devolução do dinheiro em dobro, com juros e correção.

A devolução do valor abusivo deve acontecer de uma só vez, em até 15 dias, e corrigida com os encargos devidos. Após o prazo, incide acréscimo de 10% de multa e, se não for pago, podem ser penhorados os bens da construtora.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: Diferentemente dos financiamentos comuns, em que os recursos só são liberados pelos bancos após a expedição do 'habite-se' do imóvel, dentro do regime de financiamento do "Minha Casa, Minha Vida" os valores são liberados ao construtor/ incorporador ainda na fase inicial das obras. Durante este período, a Caixa Econômica Federal cobra somente os juros do financiamento (denominados juros de obra), passando a cobrar o principal financiado somente após o seu término. Ocorre que, caso a entrega do imóvel atrase, o seu comprador continuará a pagar juros. Assim, como não bastasse todos os impactos negativos que o atraso na entrega das chaves do imóvel pode gerar - desde a privação do bem até a necessidade de outra moradia. O pagamento desses juros em caso de atraso na obra onera mais o adquirente, já que, na prática, ocorre um aumento do custo de aquisição.Com a acertada publicação dessa tese, é considerada ilícita a incidência do pagamento dos juros no período de atraso na obra, ratificando os dispositivos de segurança jurídica necessários para o cumprimento de contratos de aquisição de imóveis na planta. O consumidor que quiser contestar a cobrança da taxa de evolução da obra tem um prazo de três anos após o pagamento total para reclamar em juízo.

João Neto

Advogado

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FONTES:

aasp.org.br

jusbrasil.com.br

migalhas.com.br

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economia.uol.com.br