PROBLEMA: Arrendamento de terras para plantio, arrendatário não pagou as despesas locatícias.
SOLUÇÃO: Rescisão contratual sobre arrendamento com cobrança.
Os contratos agrários de cessão de terras são utilizados na agricultura e na pecuária com objetivos distintos, tanto por quem cede a propriedade quanto por quem opta por utilizar a terra de terceiros. Basicamente, são quatro os tipos de proprietários que cedem suas terras a terceiros. O primeiro inclui aqueles que desejam auferir renda e manter seu patrimônio, mas falta infraestrutura (máquinas e implementos) para manter uma atividade agrícola e sobram dificuldades financeiras.
O segundo tipo é o pecuarista, que disponibiliza terras para reduzir custos de reforma e recuperação de pastos ou mesmo para formar pasto. Na reforma, é comum o sistema de rotação de culturas, benéfico para a recuperação da pastagem. Já na formação, há cessão para a plantação de lavouras ou para madeireiras.
O conceito de arrendamento rural é um dos mais importantes no direito agrário e está discriminado no artigo 3º do Decreto 59.566/66, que regulamenta o Estatuto da Terra. Na legislação Brasileira, tais contratos estabelecem relações jurídicas de natureza privada e têm como finalidade a exploração da terra, mantendo sua função social. O legislador, ao elaborar o Estatuto, concedeu o direito de propriedade aos trabalhadores agrícolas, para que explorassem práticas rurais.
Arrendamento rural é o contrato agrário em que uma das partes cede à outra o uso e gozo do imóvel rural. É como uma espécie de locação de terra. Além disso, esse contrato pode incluir outros bens, benfeitorias e facilidades.
Historicamente, as bases da economia mundial estão assentadas na produção primária, na qual se destacam as atividades extrativistas, a agricultura e a pecuária, praticadas em terras públicas ou particulares. Em nosso país não é diferente, visto que temos acentuada vocação agropastoril. Tanto que popularmente cunhamos a conhecida expressão "Brasil, celeiro do mundo". Essa vocação e a necessidade de produzir alimentos fez surgir as diversas situações de exploração da terra por terceiro não proprietário, reguladas pelos contratos agrários. Existentes desde o período colonial, quando as terras brasileiras pertenciam à Coroa Portuguesa, e eram cedidas aos capitães-donatários através de uma espécie de contrato agrário chamado carta-régia, passando pelo Código Civil de 1916, de característica eminentemente individualista e patrimonialístico, quando foram tratados supletivamente na locação de prédio rústico. Desse modo, até 1964, predominou a soberana liberdade individual de contratar. Isso significa dizer que, até então, nenhum fator externo influenciava, direta ou indiretamente, na vontade de quem contratava. Ocorre que essa total liberdade e falta de dirigismo normalmente possibilitavam o desequilíbrio contratual, que impunha ao não proprietário apenas a hipótese de aderir à vontade do proprietário. Todavia, em 1964 o Estatuto da Terra procurou regrar as relações contratuais advindas do uso e da posse da terra. O Estado passou a dirigir as vontades das partes nos contratos agrários, com uma visível conotação social, assegurando maior proteção contratual ao detentor da força de trabalho e que vem temporariamente possuir a terra de forma onerosa. Esse é o propósito deste trabalho. Tenciona, sem a pretensão de esgotar o assunto ou esmiuçá-lo totalmente, fazer uma abordagem técnica do contrato agrário nominado de arrendamento rural. Sem deixar de atentar para as características e os costumes da nossa região e do Estado, que, por vezes, deixam de considerar a legislação pertinente para adotarem regras próprias que não deixam de operar como normas. Para tanto, ataca inicialmente o princípio da função social dos contratos, norma orientadora que apesar de não ser contemporânea ao Estatuto da Terra, contempla sua ideologia, e veio como instrumento de segurança e harmonia social no mundo dos negócios.
O texto constitucional brasileiro de 1988 dá garantia de inviolabilidade à propriedade, garantindo-a (art. 5º, XXII), porém, dispõe que a propriedade privada deve atender à função social (art. 5º, XXIII). Nesse mandamento constitucional insere-se também o contrato contemporâneo, que agora objetiva tornar a relação negocial economicamente útil e socialmente valiosa.
Em março de 2016, a Terceira Turma negou provimento a recurso especial que analisava a possibilidade de ser considerado como prova escrita sem eficácia de título executivo o contrato de arrendamento rural que determinava a entrega de produtos agrícolas como forma de pagamento, o que possibilitaria a propositura de ação monitória. O REsp 1.266.975, de relatoria do ministro Villas Bôas Cueva, tratava de caso em que o contrato de arrendamento rural estabeleceu o pagamento em 1.060 sacas de soja de 60 quilos. A ação monitória teria sido proposta porque o ocupante da área permaneceu nela por dois anos, sem cumprir sua obrigação. Com base nos artigos 2º e 18, parágrafo único, do Decreto 59.566/66, o ocupante da área alegou que o contrato não poderia servir como prova escrita por ter sido ajustado em quantidade de produtos agrícolas, o que o tornaria nulo. Em relação à possibilidade de considerar como prova escrita sem eficácia de título executivo os contratos nessa situação, o relator ressaltou que "o Superior Tribunal de Justiça, atento à referida disposição legal, orienta-se no sentido de ser nula cláusula de contrato de arrendamento rural que assim dispõe. Todavia, tem entendido, igualmente, que essa nulidade não obsta que o credor proponha ação visando à cobrança de dívida por descumprimento do contrato, hipótese em que o valor devido deve ser apurado, por arbitramento, em liquidação de sentença", explicou Villas Bôas Cueva.
Importante destacar que a literalidade da lei que trata do arrendamento rural deve ser interpretada de forma sistemática, isso é, deve ser levado em consideração diversos fatores, dentre os quais os costumes, que é utilizado pelos tribunais pátrios para julgar casos ligados à terra. Não obstante a lei seja a principal fonte do Direito, este emerge, também, do costume do povo, razão pela qual o Direito deve levar em consideração este importante componente, que são práticas usuais tornadas regras no meio social, haja vista que é justamente a utilização do costume que irá corrigir distorções que podem ocorrer com a mera aplicação da fria letra da lei.
Em contrapartida, a pessoa paga certa retribuição ou aluguel. Segundo o Estatuto da Terra, em regra, a quantia máxima do aluguel é de 15% do valor cadastral do imóvel. A exceção fica para arrendamento parcial de glebas, para exploração intensiva da alta rentabilidade, situação em que o limite chega a 30%.Existem, ainda, outras particularidades a esse tipo de contrato, já que ele segue o princípio da função social. Os efeitos do contrato devem repercutir de forma positiva na sociedade, trazendo vantagens à população, pois, caso contrário, cabe ao juiz intervir, para preservar o interesse coletivo. Um exemplo para ilustrar a possibilidade de intervenção por parte do juiz é quando ficam estabelecidos, nas cláusulas, juros excessivamente altos. Pois, com a alta chance de inadimplemento, a circulação do crédito fica mais difícil, os investimentos produtivos ficam mais baixos e o Estado se desenvolve mais lentamente. Quanto ao prazo, a legislação coloca um tempo mínimo de 3 anos. Porém, cabe renovação após o encerramento, que pode ser por qualquer tempo anual. As normas de arrendamento rural e recentes decisões do STJ ainda abordam outros detalhes, para casos específicos, como falecimento e realização de benfeitorias. Assim, vale uma consulta com um profissional especialista para essas e outras situações.
Entre os pecuaristas, são três os motivos principais para usar a área de terceiros: a terra própria é utilizada pela agricultura e precisam da área de terceiros para o gado, a pastagem diminui no inverno e a terra própria não atende as necessidades do gado e, ainda, há mais gado do que pasto. Os produtores de cana-de-açúcar, por sua vez, solicitam a terra de terceiros para reduzir os investimentos na imobilização de capital. Por fim, os pequenos arrendatários ou parceiros, com pouca ou nenhuma terra para produzir, são pobres e pouco tecnificados. Geralmente, dedicam-se à hortifruticultura, a qual não exige extensas áreas para plantar nem muitos investimentos.
É sabido que no caso do arrendamento rural a lei nº 59.566/66 dispõe sobre os critérios para o cálculo dos preços de arrendamento em cada imóvel rural, destacando que para a fixação do prezo o legislador deu atenção especial para fins de corrigir distorções. Assim, a lei em questão determinou em seu Art. 18 que o preço do arrendamento só pode ser ajustado em quantia fixa em dinheiro, sendo que para atender as peculiaridades do objeto desta modalidade contratual, a lei facultou que o pagamento possa ser ajustado para ser realizado tanto em dinheiro quanto em quantia de frutos, cujo preço corrente no mercado local, nunca inferior ao preço mínimo oficial, equivalha ao do aluguel, à época da liquidação. Assim, diante da literalidade do texto da lei a conclusão é a de que caso o preço do arrendamento seja ajustado em produtos não restaria outra possibilidade senão a de nulidade da cláusula contratual que assim disponha sobre a fixação do preço. Ocorre que os tribunais pátrios, em especial o Superior Tribunal de Justiça, tem relativizado a taxatividade do texto da lei, ou seja, tem interprestado de forma sistemática o preceito legal para fins de ajustar a aplicação da lei ao caso concreto em consonância com os princípios gerais do direito e, em especial, com os costumes do local onde é avençado o contrato.
Outra questão importante, no que se refere aos contratos de arrendamento rural, trata dos prazos mínimos. Com o objetivo de promover a conservação dos recursos naturais, os contratos agrários devem obedecer aos prazos estabelecidos no artigo 13 do Decreto 59.566/66. Os prazos mínimos variam de três anos (nos casos de arrendamento em que ocorra atividade de exploração de lavoura temporária e/ou atividade de pequeno porte) a sete anos (quando há atividade de exploração florestal). No REsp 1.336.293, a criação de gado bovino havia sido reconhecida como pecuária de pequeno ou médio porte, portanto, o contrato deveria ter validade de, no mínimo, três anos. No entanto, o recorrente alegou que o contrato deveria ser de, pelo menos, cinco anos, por se tratar de criação de grande porte, "seja em virtude do total da área dos contratos, de 86,7 hectares, seja em virtude da criação de animais de grande porte, como bovinos, equinos e ovinos, devendo-se levar em consideração, principalmente, aspectos relativos ao tempo necessário para a cria, recria e engorda". Ao decidir pela aplicação do prazo de cinco anos ao contrato, o relator, ministro João Otávio de Noronha, mencionou os ensinamentos de Helena Maria Bezerra Ramos, para quem a pecuária de médio porte refere-se à criação de suínos, caprinos e ovinos, excluindo a criação de gado bovino. "Mesmo ciente de que existe doutrina em sentido contrário, alinho-me à orientação doutrinária de que a criação de gado bovino é suficiente para caracterizar a pecuária como de grande porte, sendo necessário maior prazo do contrato de arrendamento rural em razão dos ciclos exigidos de criação, reprodução, engorda ou abate", definiu João Otávio de Noronha.
Assim, não obstante a legislação obrigar o proprietário do imóvel a notificar, com antecedência mínima de seis meses, o arrendatário do propósito de reaver o imóvel, as decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça tem dado interpretação sistemática à lei, aceitando a tese de que nos casos de ação de despejo fundada na falta de pagamento do arrendamento, "o ato de citação serve para a produção de todos os efeitos jurídicos decorrentes da cientificação da contraparte, sobre a manifestação da vontade expressa na petição inicial, oportunizando, inclusive, a purgação da mora". (REsp 33.469/MG, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 12.09.1994).Portanto, a necessidade de notificação prevista nos incisos IV e V do Art. 95 da Lei nº 4.504/64 não se reveste de absolutismo, cabendo relativização de acordo com o caso a ser analisado.
ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: É comum se deparar com casos onde as partes (arrendatário e arrendador) entabulam contratos de arrendamento rural sem observar a legislação que rege esse tipo de contrato, fato este que acaba levando aos tribunais questões simples que poderiam ser solucionadas caso os contratantes buscassem orientação técnica no momento da avença contratual. Assim, deduzimos que a avença contratual não pode mais ser avaliada apenas em seus requisitos formais de validade, como, por exemplo, agente capaz, objeto lícito, forma prescrita em lei, livre manifestação de vontade, etc., mas atualmente, também é necessário que se observem os limites à liberdade de contratar em prol do bem comum. Podemos afirmar, sem dúvida, que atualmente o contrato não é considerado somente como um instrumento de circulação de riquezas, mas, também, de desenvolvimento social. O Advogado tem qualidade técnica para apurar as nuances de um contrato de arrendamento, além de formaliza-lo e assessorar no acompanhamento de suas cláusulas. Além da parte administrativa, incluindo a notificação extrajudicial, o Advogado tem de ser consultado para propositura e defesa em ação judicial que verse sobre arrendamento rural.
João Neto
Advogado
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FONTES:
stj.jus.br
ambito-juridico.com.br
conteudojuridico.com.br
agroadvisor.com.br
ibijus.com
terra.com.br